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Também existem os fundamentalistas católicos que acreditam possuir a verdade absoluta e vão pela vida difamando os demais, disse o Papa

Briefing at Papal flight. Nov. 2015

Vatileaks: "Foi um erro nomear Balda e Chaoqui”. Clima: “À beira de um suicídio”. África: “Vítima de potências”. Imprensa: “Não seja difamatória”. E depois, as guerras, aids, fundamentalismos e muito mais na entrevista no voo Bangui-Roma

 Salvatore Cernuzio |   |  ZENIT.org |  Papa Francisco |  Roma |  426
As nomeações de Vallejo Balda e Chaouqui? Um erro. A luta contra a corrupção? O trabalho já começou com Ratzinger. A imprensa? Denuncie a corrupção, mas seja profissional, não difamatória. A Aids na África? Existem problemas piores. A guerra? Um negócio de dinheiro e poder. Os problemas climáticos? É necessário mudanças. Estamos à beira do suicídio. A África? Uma bela surpresa... Muitos são os detalhes na entrevista que o Papa Francisco concedeu, como de costume, para os 74 jornalistas que o acompanhavam no vôo Bangui-Roma.
Entrevista que, a princípio, parecia que estava sendo substituída com uma breve saudação do Pontífice, talvez para evitar entrar no mérito do processo do assim chamado Vatileaks 2, ainda em andamento. Mas, em vez disso, Francisco começou exatamente desse ponto, falando desse segundo caso de vazamento de documentos reservados e chegando a dizer, sem muitas palavras que a nomeação do monsenhor espanhol e da calabresa-marroquina à Cosea “foi um erro”.
Vatileaks. Nomeação Balda e Chaoqui à Cosea, um “grave erro”
"Vallejo - disse o Papa - entrou para o cargo que tinha: era o secretário da Prefeitura para os Assuntos Económicos. Como ela entrou? Não estou certo, mas acho que, se não me engano, foi ele que a apresentou como uma mulher que conhecia o mundo das relações comerciais. Trabalharam e quando terminou o trabalho, os membros da Cosea permaneceram em alguns cargos no Vaticano. A senhora Chaouqui não ficou no Vaticano: alguns dizem que ficou brava por isso. Os juízes nos dirão a verdade sobre as suas intenções, como o fizeram. Para mim não foi uma surpresa, não me tirou o sono, porque deram a conhecer o trabalho começado pela comissão dos nove cardeais, o de procurar a corrupção e as coisas que não estão bem”.
O trabalho de Ratzinger contra a "sujeira" na Igreja
Falando de corrupção, em Francisco se desperta a memória daqueles 13 dias anteriores à morte de São João Paulo II quando, durante uma inesquecível Via Sacra, o então cardeal Ratzinger falou da “imundície” da Igreja. Uma memória viva e grata do Papa ao seu predecessor: “Ele denunciou primeiro”, afirma. “Nós o escolhemos por causa dessa sua liberdade de dizer as coisas. Desde aquele momento que está no ar que no Vaticano existe corrupção”.
"O trabalho de limpeza continua!"
Em todo caso, “agradeço a Deus de que não esteja mais Lucrezia Borgia!”, acrescenta Bergoglio. “Devemos continuar com os cardeais e as comissões a obra de limpeza”. Em quanto ao processo, “não li as acusações concretas...- explica o Papa – deveria acabar antes do Jubileu, mas acho que não será possível porque gostaria que todos os advogados da defesa tenham o tempo para desempenhar o seu trabalho e que haja liberdade de defesa”.
Desinformação, calúnia, difamação: três efeitos que ameaçam o profissionalismo da imprensa
Um aviso também vai para a imprensa que, "livre, laica e até mesmo confessional", deve, de qualquer forma, ser “profissional”. “O importante – diz o Pontífice – é que sejam profissionais e que as notícias não sejam manipuladas. Para mim é importante, porque a denúncia das injustiças e das corrupções é um bom trabalho. A imprensa profissional deve dizer tudo, mas sem cair nos três pecados mais comuns: a desinformação, ou seja, dizer só uma metade da verdade e não a outra; a calúnia, quando a imprensa não profissional suja as pessoas; a difamação, que é dizer coisa que tiram a reputação de uma pessoa”. Também: “um verdadeiro jornalista profissional, se erra, pede desculpa”.
"A África? Tanto sofrimento, mas também uma grande surpresa"
Com um olhar sempre fixo na atualidade, o Papa Francisco recorda a sua viagem finda no Quênia, Uganda e na República Centro Africana. Portanto, a “grande dor” experimentada entre as pessoas pobres do slum Kangemi ou no hospital pediátrico, o único de Bangui e do país, onde “em terapia intensiva porque não têm oxigênio, havia muitas crianças desnutridas." Mas também a enorme "alegria" e "surpresa" ao ver "a multidão... aquela multidão, aquela capacidade de festejar, de fazer festa ainda tendo o estômago vazio”. “Sentiram-se ‘visitados’, têm um sentido de acolhida muito grande...”, observa o Papa. Cada um com uma sua “identidade”: o Quênia “um poucuo mais moderno e desenvolvido”; a Uganda com a sua herança dos mártires; a República Centro-Africana com a sua “vontade de paz, reconciliação, perdão”.
A África é uma vítima
No geral, a África continua a ser uma "vítima", denunciou o Santo Padre. "A África sempre foi explorada por outras potências” que “procuram só explorar as grandes riquezas, mas não pensam em ajudar no crescimento do País, em fazer com que todos possam trabalhar”. A África é “mártir da exploração. Aqueles que dizem que da África vêem todas as calamidades e todas as guerras não conhecem bem o mal que fazem à humanidade certaz formas de desenvolvimento. E por isso eu amo a África, porque foi uma vítima de outras potências”. Voltará?, perguntaram-lhe. “Não sei”, responde Jorge Mario Bergoglio, “eu sou velho, as viagens são cansativas!”.
Confirmada viagem ao México. O desejo de visitar a Armênia
Enquanto isso, já estão agendadas as datas no México, embora ainda não exatas. “As viagens, na minha idade, não fazem bem, deixam marcas”, ironiza o Papa, explicando que, em primeiro lugar, vai ao México para visitar a “Mãe da América” (Nossa Senhora de Guadalupe, ndr), depois “três ou quatro cidade que nunca tenham sido visitadas pelos Papas”: Chiapas, Morelia e Ciudad Juarez. O desejo de Bergoglio seria poder visitar também a Armênia, por ocasião do 101º aniversário de Metz Yeghern, o genocídio que atingiu a população há um século. “No ano passa prometi aos três patriarcas que iria. Há uma promessa”.
A guerra, uma questão de interesses, na qual, por trás, há dinheiro e poder
O problema é que "depois chegam as guerras”, explica o Papa, comentando a recente crise entre a Rússia e Turquia. As guerras, destaca, “acontecem por ambição. Não falo daquelas feitas para defender-se justamente de uma injusta agressão. As guerras são uma indústria, na história vimos muitas vezes que um País com o orçamento ruim decide fazer uma guerra e assim estabiliza o seu orçamento. A guerra é um negócio. Os terroristas, eles fabricam as armas? Quem lhes dá as armas? Há toda uma rede de interesses, onde por trás há dinheiro, ou poder”.
"Nós, há anos, estamos em uma guerra mundial em pedaços e cada vez os pedaços são menos pedaços e são sempre maiores”, observa ainda o Pontífice. “As guerras são um pecado, destroem a humanidade, são a causa de exploração, tráfico de pessoas. Devem parar... as guerras não são de Deus, Deus é o Deus da paz, criou o mundo todo belo”.
O fundamentalismo não é religioso, é idolatria!
Daí a ocasião para abordar outro assunto espinhoso: o fundamentalismo religioso que ameaça todo o planeta, como demonstram os recentes ataques em Paris. O fundamentalismo, explica o Papa, é "uma coisa ruim", uma "doença" que "existe em todas as religiões." "até nós católicos temos alguns – muitos – que acreditam que possuem a verdade absoluta e seguem em frente sujando os demais com a calúnia, a difamação, e fazem o mal”. Portanto, é necessário “combater” o fundamentalismo religioso, simplesmente porque “não é religioso, falta Deus, é idolátrico”.
Religiosos na Política? Melhor não
E, em particular, cabe aos líderes religiosos opor-se. Isso significa que eles “devem intervir mais no campo político?”, pergunta um jornalista. “Se intervir em campo político quer dizer fazer política, não”, replica a queima roupa Bergoglio, “sejam sacerdotes, pastores, imã, o rabino. Mas, se faz política indiretamente pregando os valores verdadeiros, e um dos maiores é a fraternidade”.
Diálogo com o Islã: "Tem valores construtivos”
No mesmo sentido, o Bispo de Roma observa que com o Islã "é possível dialogar”, porque “eles têm muitos valores, e estes valores são construtivos”. “Não se pode apagar uma religião porque existem alguns ou muitos grupos de fundamentalistas em um certo momento da história. É verdade, as guerras entre religiões sempre existiram, mas também nós devemos pedir perdão... Quantas guerras nós, cristãos, fizemos? O saque de Roma não foi feito pelos muçulmanos".
Aids na África: “Guerra e tráfico de armas matam mais”
Sobre o uso de preservativos para combater a Aids, chaga extremamente difundida na África, Bergoglio diz: “Sim, é um dos métodos. A moral da Igreja encontra-se, neste ponto, perante uma perplexidade: defender a vida ou a relação sexual aberta à vida”. Porém, segundo o Papa, “não é este o problema”; existem maiores como “a desnutrição, a exploração, o trabalho escravo, a falta de água potável”. “Não falemos se é possível usar tal esparadrapo para uma tal ferida. A grande injustiça é uma injustiça social, a grande injustiça é a desnutrição”, destaca o Papa. “Não gosto de descer a reflexões casuísticas quando as pessoas morrem por falta de água e de de fome. Pensemos no tráfico das armas... Isso e as guerras são o maior motivo de mortalidade”.
Mudanças climáticas: "Estamos à beira do suicídio..."
Igualmente realista é o ponto de vista de Francisco sobre a situação das mudanças climáticas, à luz também da Cop21 aberta ontem em París. “A cada ano os problemas são mais graves...”, afirma, “estamos à beira de um suicídio, para usar um termo forte, e eu garanto que quase a totalidade daqueles que estão em París tem esta consciência e querem fazer alguma coisa. Um dia desses li que na Groenlândia as geleiras perderam milhares de toneladas. No Pacífico há um País que está comprando um outro País para mover-se porque daqui a 20 anos não existirá mais... Confio nessas pessoas, confio que farão alguma coisa”. 

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