Pular para o conteúdo principal

OS ENFERMOS ESQUECIDOS



No Hospital das Clínicas, quem já teve oportunidade de ir à Ortopedia, verá quantos jovens, ou pais de famílias acidentam-se em São Paulo diariamente, seja por atropelamento, seja por estarem dirigindo motos, e outros mais. Não falo dos que morrem, que são muitos, mas dos que sobrevivem

Acidentes de trabalho também são comuns, com fraturas e amputações de membros do corpo: mãos e dedos de trabalhadores, entre outros.

Idosos(as) também chegam, por fraturas consideradas "naturais", por ocorrerem durante um simples caminhar. 

Existe de tudo, gente que cai no fosso do elevador, do apartamento, de escada, de árvore. Enxertos são comuns, como complementação destes tratamentos. Tiram parte da pele de um lugar e enxertam em outra parte. É um verdadeiro mundo. Tenho dois amigos que estão desde crianças na UTI. Hoje devem ter seus 40, mais ou menos. A Eliana é uma amiga delas. Correspondemo-nos pela internet, de vez em quando

O quadro de médicos de lá, acabou tornando-se um grupo de especialistas, porque se defrontam com tantas situações novas que acabam sendo muito criativos.

Sábado à tarde, meu horário de pastoral da saúde, visitando os enfermos da Ortopedia, tive oportunidade de visitar uma senhora, de idade, agonizando, às vésperas da morte. Não sei se estava consciente, provavelmente não.

Sei apenas que estava sem nenhum parente junto a ela.

Morreria ali, sozinha, entubada, num quarto com outra senhora enferma, que se sentia incomodada com a situação e a  movimentação das enfermeiras, que aguardavam sua morte, desenganada que estava.

Fico pensando, porque não estava  acompanhada por seus parentes e amigos íntimos, morrendo assim, esquecida. Que forma mais triste de se despedir da vida.

Fiz uma oração, ao pé da cama, e conservei aquela sua imagem em minha mente até o domingo, na comunhão. Creio que partiu.

Até onde vai nossa humanidade? As nossas convicções sociais e políticas não passam por uma posição de compartilhamento com os "esquecidos", os enfermos, os mendigos, os presos?

 Às vezes existe um fosso, entre nossa formação política e uma posição "assistencial", se pudermos dizer assim.

Mas acredito que uma coisa e outra tem muito a ver, sendo inclusive fator de aferição da fidedignidade das convicções das pessoas, porque, como posso ser um defensor de grandes ideais, se não co-participo naquilo que é mais frágil na pessoa humana, seu abandono, suas misérias.

Estou falando algum absurdo?

Fiz a escolha do que é mais fraco, do que me rende menos dividendo político. Não conseguirei votos nestas visitas. Mas há uma satisfação pessoal sem preço, de ter feito algo útil.

O socialismo passa por uma irmandade, uma humildade, uma simplicidade de vida, uma solidariedade, uma ajuda gratúita, uma conversa de amigo, um reforçar de esperanças, um alegria constante, uma unidade na diversidade, um apego ao sofredor.

Preciso falar mais?

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

Soneto de Dom Pedro Casaldáliga

Será uma paz armada, amigos, Será uma vida inteira este combate; Porque a cratera da ... carne só se cala Quando a morte fizer calar seus braseiros. Sem fogo no lar e com o sonho mudo, Sem filhos nos joelhos a quem beijar, Sentireis o gelo a cercar-vos E, muitas vezes, sereis beijados pela solidão. Não deveis ter um coração sem núpcias Deveis amar tudo, todos, todas Como discípulos D'Aquele que amou primeiro. Perdida para o Reino e conquistada, Será uma paz tão livre quanto armada, Será o Amor amado a corpo inteiro. Dom Pedro Casaldáliga

UM CORPO ESTENDIDO NO CHÃO

 Acabo de vir do Largo de Pinheiro. Ali, na Igreja de Nossa Senhora de M Montserrat, atravessa  a Cardeal Arcoverde que vai até a Rebouças,  na altura do Shopping Eldorado.   Bem, logo na esquina da igreja com a Cardeal,  hoje, 15/03/2024, um caminhão atropelou e matou um entregador de pão, de bike, que trabalhava numa padaria da região.  Ó corpo ficou estendido no chão,  coberto com uma manta de alumínio.   Um frentista do posto com quem conversei alegou que estes entregadores são muito abusados e que atravessam na frente dos carros,  arriscando-se diariamente. Perguntei-lhe, porque correm tanto? Logo alguém respondeu que eles tem um horário apertado para cumprir. Imagino como deve estar a cabeça do caminhoneiro, independente dele estar certo ou errado. Ele certamente deve estar sentindo -se angustiado.  E a vítima fatal, um jovem de uns 25 anos, trabalhador, dedicado,  talvez casado e com filhos. Como qualquer entregador, não tem direito algum.  Esta é minha cidade...esse o meu povo

Homenagem a frei Giorgio Callegari, o "Pippo".

Hoje quero fazer memória a um grande herói da Históra do Brasil, o frei Giorgio Callegari. Gosto muito do monumento ao soldado desconhecido, porque muitos heróis brasileiros estão no anonimato, com suas tarefas realizadas na conquista da democracia que experimentamos. Mas é preciso exaltar estas personalidades cheias de vida e disposição em transformar o nosso país numa verdadeira nação livre. Posso dizer, pela convivência que tive, que hoje certamente ele estaria incomodado com as condições em que se encontra grande parte da população brasileira,  pressionando dirigentes e organizando movimentos para alcançar conquistas ainda maiores, para melhorar suas condições de vida. Não me lembro bem o ano em que nos conhecemos, deve ter sido entre 1968 e 1970, talvez um pouco antes. Eu era estudante secundarista, e já participava do movimento estudantil em Pinheiros (Casa do estudante pinheirense - hoje extinta), e diretamente no movimento de massa, sem estar organizado em alguma escola,