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Peão de Black Tie, só para sobreviver

Hoje, sábado, 16 de outubro de 2010, esperando o ônibus  no maior calor, para dirigir-me ao Hospital das Clínicas, setor de Ortopedia, onde faço a Pastoral da Saúde, em visita aos enfermos, assisti uma cena que mostra o quanto o homem se submete às humilhações para sobreviver.

Um senhor de uns 45 anos, aproximadamente, estava vestido com um black Tie (daqueles da Móoca, é verdade, mas Black Tie), com gravatinha borboleta e tudo , no cruzamento da Avenida Pacaembú na altura do memorial da América Latina.

Fazia divulgação de um folheto de lançamento de conjuntos comerciais da chamada "SP Oeste/Pacaembú". Chique do úrtimo, naquele calor de torrar.

Era preciso dar uma demonstração de que o lançamento é para gente chique, por isso o Black Tie em cima do coitado. Ou não? Porque, de fato ele não demonstrava aversão ao tratamento, e quem sabe até se sentia bem, como se estivesse no centro das atenções...

Os motoristas dos carros que aguardavam a abertura do sinal, abriam as janelas e recolhiam os folhetos, entre surpresos e solidários com aquela pessoa tão diferenciada, ali, do lado de fora.

Um casal de jovens, ao meu lado no ponto, aguardando também o ônibus, compartilharam comigo esta observação, e num dado momento o rapaz disse que já tinha feito a barba para manter um trabalho.

Enguli seco, porque também eu já me adequei na vestimenta, na barba, etc, só para me manter uma imagem acessível e aceita.

Somos imagens estranhas a nós mesmos, por falsa adequação social, fazendo de tudo para sobreviver.

Somos tantos, que nos perdemos numa esquisofrenia inusitada, e socialmente aceita, estranho não?

À noite
vou tirando
máscara atrás de máscara.

Quando termina,
não tem ninguém.

Talvez um
outro eu,
ou simplesmente
um outro.

Ficamos por aqui.

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