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O legado dos movimentos sociais de junho no Brasil para os movimentos populares organizados

Este legado é indireto e o movimento social organizado vai assimilando aos poucos estes ensinamentos. 

Vamos a eles:

1) Autopercepção do comodismo e paralisia. Antes de junho tinha-se uma leitura de que as conquistas estavam sendo encaminhadas via governo Dilma. Mera ilusão. Esta leitura tem fundamento socialdemocrata de política, no sentido desmobilizador e transferidor  dos problemas para uma terceirização das reivindicações a outros atores.

2) Paternalismo sindical, onde os dirigentes viviam de reivindicações burocráticas, com total esvoaçamento de papéis que nunca chegava a lugar nenhum, enquanto conquistas antigas iam sendo desmontadas pela borda da política oficial (diga-se Congresso Nacional).

3) Distanciamento das massas. A simples surpresa do surgimento do movimento de junho mostrou o quanto o movimento organizado chegou a distanciar-se das grandes massas e burocratizou-se. Com o movimento nas ruas, deu-se conta do envelhecimento político do movimento organizado.

4) Estruturas partidárias rígidas e impermeáveis. O surgimento de um grande movimento de massa convocado informalmente pela internet, mostrou uma combinação sui generis de participação individual em rede, com uma rejeição das estruturas partidárias. Terreno propício para o anarco banditismo que acabou predominando, quando o movimento entrou em refluxo. A revolução nas comunicações exige uma reformulação das estruturas formais, no sentido de absorver esta novidade. Este quadro ainda é por demais novo, para se ter uma visão mais concreta de caminhos. Mas abre um novo leque de opções disponíveis a serem experimentadas.

4) Releitura das Bandeiras de luta. Com os governos Lula e Dilma, as bandeiras de luta não foram renovadas, mas inutilmente reiteradas sem que as massas fizessem delas uma questão pessoal. Ao contrário, foram surgindo questões aparentemente menores mas que tomaram contornos de principais, sendo progressivamente assimiladas pelas massas, sob influência dos jovens de estratos médios da população. Por outro lado, os setores populares, por força das alianças feitas, tiveram que, ao longo do tempo, assimilar a contra gosto, uma convivência indesejável com políticos corruptos e situações de sangria do erário público. Bandeiras que foram sendo transferidas progressivamente para a oposição ao governo. Esta é uma questão que ainda não foi digerida pelo movimento popular, que precisa fazer uma inflexão a respeito.
5) Envelhecimento da Gestão de Frente Nacional e Popular.   Estas manifestações puseram em cheque a falsa permeabilidade dos Governos Lula e Dilma, seja escolhendo sempre os mesmos, seja cooptando empresários notadamente contrários ao Governo. Enquanto isto não se criou nem se confrontou políticas populares com as existentes, mas em muitos aspectos deu-se continuidade ao odo de vida tucano. Vide política econômica do Governo. É necessário fazer-se uma nova leitura de Governo Popular e Nacional, retirando-se os aspectos do ranço social democrata que prevalece atualmente em muitas áreas. A política internacional, por exemplo retroagiu. 

6) As liberdades individuais podem circunscrever-se dentro dos direitos sociais. A velha dicotomia entre socialismo e liberdades individuais voltam a tona, e devem ser agora consideradas com mais seriedade.

Citei os 6 aspectos que me vem a mente no momento. O movimento de junho não traz uma contribuição direta muito grande, mas traz um legado indireto imenso a ser considerado. Quem vencerá? A burocracia ou a inovação?

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