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Qual é o substrato filosófico que está por trás de se afirmar que alguém "é do bem".

Acostumou-se no Brasil e creio que pelo mundo afora a se utilizar frases descoladas, aparentemente, de contextos filosóficos ou religiosos ou éticos, como expressão de uma libertação das tradições, com os quais não se concorda.

Conceitos como bom e mau, certo e errado, e ainda, alto ou baixo, magro ou gordo, preto ou branco, e mais, justo e injusto, fraco ou forte, permeiam a nossa vida a todo instante, e têm uma variabilidade incrível. O que pode ser bom para mim, não o é para outro, e assim por diante.

Utilizamos, entretanto, estes conceitos com tanta naturalidade, e os aplicamos como se eles estivessem introjetados nas pessoas, com a mesma compreensão, de sorte que imaginamos estar falando uma mesma linguagem.

Disto podemos delinear uma primeira hipótese:

Há, nas pessoas a idéia, ainda que não claramente definida, de que existem valores compartilhados em comum, que nos permitem homogeneizar e universalizar valores, e se não, nos ajudam a isso.

Estes valores provindos das formações religiosas, familiares e educacionais, profissionais e até políticas, colocam nesta pós-contemporaneidade em que vivemos, um questionamento da independência do indivíduo, do seu direito ao isolamento, em sua liberdade em fechar-se.

Daí o surgimento dos conceitos despregados da realidade, como forma de isenção, como se valores fossem produtos que se pudessem pegar em prateleiras de supermercados, para se usar em diversas situações.

Não se fala em Deus, em essência; não se fala em pai e mãe, em escola, professor, mas diz-se que é "do bem".

Comercializou-se o valor.

Interessante, também é a não utilização do eventual ser "do mal".

Para um mundo que fecha os olhos e não quer reconhecer os problemas, a negação da dicotomia entre bem e mau, se desfaz num harmônico "ser ou não ser do bem".

Portanto, o mal já não mais existe.

Conclui-se que a melhor forma de eliminá-lo, será não citá-lo.

Recuso-me a fazer este jogo. Reconhecer fraquezas é fundamental na vida.

Aceito os valores que me foram trazidos, e que passaram por minha reflexão crítica.

Aceito-os e rejeito-os. Eles estão, sempre, sendo postos à prova pela realidade da vida.

Não posso simplesmente dizer a mim, que meus pais, o sacerdote que fez minha primeira comunhão, minha primeira professora, de quem me apaixonei, meus superiores no trabalho,  líderes políticos que conheci e admirei, estivessem simplesmente errados, e devessem ser descartadados como lixo.

Este descarte pertence a uma tendência que se denominou de Nova Era, em suas tentativas de formar uma nova moral, sem apresentar, entretanto, um campo teórico nítido.

Vem, por isso, escamoteada em meio aos meus valores, fazendo-me em dúvida, ao mesmo tempo em que não apresenta nada.

Vai entender.

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